Pelo Dr. Dário Letang

A atividade de produção audiovisual, como todas as atividades na Brasil, está sujeita a tributos e contribuições ligados ao faturamento e à folha de pagamento, além da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional – CONDECINE, devida à Agência Nacional do Cinema – ANCINE.

Ocorre que, a atividade de produção de conteúdo audiovisual, vem sendo indevida e ilegalmente tributada por muitas Prefeituras brasileiras, como sendo atividade de serviço e, pela maior alíquota possível no país (5%) do Imposto Sobre Serviços (ISS-QN); em que pese o que consta no Regulamento do ISS-QN de São Paulo, entre outras localidades, o entendimento jurisprudencial é de que, tal atividade não pode ser considerada como serviço, por absoluta falta de previsão legal entre outros argumentos.

Quando da promulgação da Lei Complementar nº. 116/2003, o item que tratava da produção de filmes, foi vetado, pelo então Presidente da República.

13 – Serviços relativos a fonografia, fotografia, cinematografia e reprografia.

“13.01 – Vetado.

13.02 – Fonografia ou gravação de sons, inclusive trucagem, dublagem, mixagem e congêneres.

13.03 – Fotografia e cinematografia, inclusive revelação, ampliação, cópia, reprodução, trucagem e congêneres.

13.04 – Reprografia, microfilmagem e digitalização.

13.05 – Composição gráfica, inclusive confecção de impressos gráficos, fotocomposição, clicheria, zincografia, litografia e fotolitografia, exceto se destinados a posterior operação de comercialização ou industrialização, ainda que incorporados, de qualquer forma, a outra mercadoria que deva ser objeto de posterior circulação, tais como bulas, rótulos, etiquetas, caixas, cartuchos, embalagens e manuais técnicos e de instrução, quando ficarão sujeitos ao ICMS.

“13.01 – Produção, gravação, edição, legendagem e distribuição de filmes, video-tapes, discos, fitas cassete, compact disc, digital video disc e congêneres.”

O item 13.01 da mesma Lista de serviços mencionada no item anterior coloca no campo de incidência do imposto gravação e distribuição de filmes. Ocorre que o STF, no julgamento dos RREE 179.560-SP, 194.705-SP e 196.856-SP, cujo relator foi o Ministro Ilmar Galvão, decidiu que é legítima a incidência do ICMS sobre comercialização de filmes para videocassete, porquanto, nessa hipótese, a operação se qualifica como de circulação de mercadoria. Como conseqüência dessa decisão foram reformados acórdãos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que consideraram a operação de gravação de videoteipes como sujeita tão-somente ao ISS. Deve-se esclarecer que, na espécie, tratava-se de empresas que se dedicam à comercialização de fitas por elas próprias gravadas, com a finalidade de entrega ao comércio em geral, operação que se distingue da hipótese de prestação individualizada do serviço de gravação de filmes com o fornecimento de mercadorias, isto é, quando feita por solicitação de outrem ou por encomenda, prevalecendo, nesse caso a incidência do ISS (retirado do Informativo do STF no 144).

Assim, resta claro que, quando da entrada em vigor da LC nº. 116/2003 (que regula o ISS-QN no território nacional) o item que previa a produção audiovisual como serviço e, portanto, tributável pelo ISS foi vetado.

Até hoje, as autoridades municipais possuem basicamente duas teses para justificar a cobrança, sendo a primeira e mais utilizada é a de equiparar a Produção Cinematográfica (Item 13.01 – vetado) à Cinematografia (item 13.03), para cobrar o ISS sobre Cinematografia e, com isso, incluir os valores de Produção Cinematográfica.

Muitas das Prefeituras municipais – incluindo-se a de São Paulo, aproveitando-se da exposição de motivos do veto (transcrita acima), passaram a cobrar o ISS, afirmando que o veto presidencial destinou-se a excluir do campo de incidência do tributo, somente os produtos que estão sujeitos ao ICMS (vídeos como mercadoria, tais como: videotapes, digital video disc e congêneres), o que exclui a hipótese de prestação individualizada do serviço de gravação de filmes, quando feita por solicitação de outrem ou por encomenda, que permaneceria sujeita a incidência do ISS, cobrando-o sobre as Produções Cinematográficas por encomenda, enquadrando tal serviço, no item 13.03 da lista.

Nenhuma das teses das administrações municipais foi aceita pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ, que decidiu contrariamente:

  • No primeiro caso (equiparação da produção cinematográfica à cinematografia) esclarecendo que o item 13.03 da Lista de Serviços contida na LC nº 116/2003 não autoriza a tributação pelo ISS do serviço de produção de filmes/vídeos por encomenda, sendo que essa atividade não se equipara aos serviços de Cinematografia, não sendo adequada a interpretação extensiva de item da referida lista, tendo em vista a existência de veto presidencial ao item 13.01, dado que à interpretação extensiva de dispositivo no enquadramento do serviço correlato em outro item equivaleria à derrubada do veto, competência exclusiva do Congresso Nacional, que não entendeu pela derrubada do veto; e,
  • Na segunda hipótese levantada pelos municípios, o STJ esclareceu que o veto presidencial se dirigia apenas à comercialização geral de fitas gravadas, dado que a Mensagem nº 362/2003, na qual ficou expresso no veto, o posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) à época (“Por outro lado, se o suporte físico contém material personalizado, elaborado segundo especificações de consumidor específico, há a incidência do ISS”STF, RE 555.796 AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, DJe-089).

Em decisão de Março de 2017 (AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 1.627.818 – DF (2016/0250557-8), o STJ entendeu que a lista de serviços da Lei Complementar é taxativa e, em razão disso, não cabe qualquer interpretação sobre os serviços nela indicados. Tal decisão enfocou também o tema da produção sob encomenda, o que descaracteriza o serviço listado no item 13.03, afinal, tal item não contempla a produção personalizada e ainda indicou julgamento anterior do próprio STJ (REsp 1.308.628/RS, em 2012, a Primeira Turma).

Em outras palavras o STJ impôs que, a partir da vigência da Lei Complementar nº. 116/03, em face de veto presidencial em relação ao item 13.01, não mais existe previsão legal que ampare a incidência do ISS sobre a atividade de produção, gravação e distribuição de filmes, seja destinada ao comércio em geral ou ao atendimento de encomenda específica de terceiro, até mesmo, porque o item vetado não fazia tal distinção.

Nesse contexto, em que pese a Prefeitura de São Paulo indicar o Serviço de Produção de Filmes como incidente para efeitos do ISS-QN e, tributável em 5%, os tribunais de todo o país e, em especial o Superior Tribunal de Justiça (como visto acima), já decidiram favoravelmente a tese das empresas produtoras audiovisuais, no sentido de que, não deve haver incidência do ISS-QN sobre suas atividades.

Se a sua empresa exerce a atividade de produtora e está sendo obrigada a recolher o ISS-QN sobre os conteúdos que produz para terceiros, entre em contato conosco para que possamos avaliar o seu peculiar caso e, consequentemente buscar nos tribunais decisão que lhe desobrigue desse ilegal encargo, sendo possível ainda, pleitear valores recolhidos indevidamente dos últimos 5 anos.

Dr. Dário Letang Atua nas áreas de Direito Tributário, Empresarial e Societário. Pós-Graduado em Direito Tributário pela Escola Paulista de Direito – EPD; MBA-Executivo pelo INSPER; Advogado e Contador.

LETANG ADVOGADOS ASSOCIADOS

www.letang-advogados.com.br – dario@letang-advogados.com.br

  • Para saber mais a respeito desse e de outros assuntos, entre em contato conosco.

× Como podemos te ajudar?